RESIGNAÇÃO X ACOMODAÇÃO
Alguma vez você falou para alguém que o ajudaria apenas da boca para fora? Alguma vez, diante da dor do outro, você apenas falou: Você tem que aceitar, tem que ser resignado! Um dia uma criança de 12 anos me fez a seguinte pergunta: “Tia, você falou que ia me ajudar, mas falou só da boca para fora, né?” E eu tive que responder: “Sim, falei da boca para fora, me desculpe!” Muitas vezes queremos que as pessoas apenas aceitem suas dores, suas expiações, mas quando somos nós que sofremos queremos alívio e esforços de todas para nos ajudar. Nascemos para vencermos! As provas servem para tirarmos boas notas e passarmos. Resignação não é inação ou acomodação e sim ação, e eu aprendi este ensinamento na prática, com a história de vida do Gabriel. Gabriel foi encaminhado pelo Juiz da Vara da Infância ao Abrigo quando tinha 2 aninhos. Só soubemos a história real dele 10 anos depois... Ele tinha 2 anos e o pai o sequestrou para se vingar da mãe e o levou a cidade onde se localiza o Abrigo. O pai sendo um espírito imaturo e leviano, causou maus tratos na criança a ponto dos vizinhos o denunciarem. A partir desta denúncia ele foi levado ao abrigo e o pai fugiu. Após busca em sua casa, os policiais encontraram uma certidão de nascimento ilegível e carcomida. Gabriel por muitos anos, diariamente pedia para levarmos a sua mãe. Os órgãos da justiça após averiguações determinaram que ele seria encaminhado para adoção por ser impossível localizar seus familiares. Aos 8 anos apareceu um casal para o adotar. No meio do processo, o casal desiste da adoção sem dar explicações. E Gabriel entra em depressão. Após terapias e afeto, Gabriel entende que ganhou mais um não da vida. Mas Gabriel é insistente em pedir para que achássemos sua mãe. Aos 11 anos um outro casal se encantou por ele, por ser bonito, inteligente e criativo. Quando o processo de adoção estava se concretizando, o homem desencarna e a esposa se desencoraja desta empreitada de adoção. E mais uma vez a vida diz não ao desejo de Gabriel de ter uma família, pois por melhor que o Abrigo seja, o ideal é sempre a família. Um dia eu cheguei e a mãe social, que reside no Abrigo, me informou que Gabriel chorou demasiado durante a noite. Ele estava com o rosto inchado e um olhar perdido na tristeza, com uma grossa e pesada lágrima a escorrer e o diálogo foi assim: Gabriel: “Tia, ache a minha mãe! “ Eu: “A justiça já investigou e não encontrou sua família, como eu poderia achá-la!?” Gabriel (olhou profundamente nos meus olhos): “Tia, Tenta!” E eu acomodada na posição da justiça de não encontrar sua mãe, não me esforcei, mas falei apenas para acalma-lo: Ok, vou tentar. No dia seguinte, ao chegar no Abrigo ele veio, me olhou nos olhos e disse: “Tia, você falou que ia me ajudar, mas falou só da boca para fora, né?” E desta vez eu tentei de verdade, e a história é longa, que deixo para outra ocasião, mas com final feliz porque encontramos seus familiares e Gabriel nem se lembrava, mas tinha um irmão gêmeo. No livro Rumos Doutrinários, Feb, de Idalício Mendes, edição 1994, página 36, está o mais belo significado de resignação. “A verdadeira resignação é serena e consciente. Ela assume o controle da situação em que se vê envolvida a criatura, dando-lhe meios de raciocinar e aceita-lo. Mesmo assim, a resignação, e não o desânimo, pode revestir-se do caráter ativo, reagindo. Como reagir? Fortalecendo-se na prece e exemplificando as lições evangélicas, com o fito de superar a provação que lhe foi imposta pela lei cármica. A resignação real não exclui a possibilidade de a criatura reagir para sobrepor-se à desventura.” Que seja a nossa meta, tentar sempre, sem desânimo e com serenidade consciente, vencer nossas provas.
Artigo publicado na Revista dos Estudos Espíritas